pena não ter sido eu a escrever isto [2]
20/Fev/2009 @ 09:00 Outros

« (…) Sei que muitos defendem que é preciso condenar o terrorismo e não compreendê-lo, mas discordo: acho que é preciso ler “A Condição Humana” e compreender Tchen, porque Tchen, como o sabem tantos homens traumatizados por actos cometidos na guerra, tantos assassinos que se não reconhecem no seu crime, vive afinal em cada um de nós.
É em nome de Tchen – ou em nome de Malraux e desse livro admirável sobre a solidão, o absurdo, o horror e a nobreza da condição humana – que cada acto de terrorismo me merece uma reflexão outra que a simples condenação. É fácil condenar, mas não me basta. Preciso de mais, preciso de compreender por que é que alguém escolhe cortar-se assim da Humanidade, por que é que em alguém a Humanidade se esvaíu a tal ponto que se torna capaz de negá-la.
Compreendo assim melhor os atentados suicidas: a solidão de Tchen, a terrível, dolorosa solidão de Tchen, ensinou-me que é mais fácil morrer com o seu crime que sobreviver com ele. E não só para o próprio, porque a violência que se desperta num ser humano pode tornar-se incontrolável mesmo para aquele que a despertou. E a náusea de Tchen, o seu horror, perante os sinais de vida que lhe chegam desse homem que deve matar, que sabe que matará, ensinou-me aquilo que todos os carrascos sabem: como são importantes as vendas e os capuzes colocados sobre aqueles que se devem abater, para que nunca um sorriso, um olhar, uma cumplicidade possa estabelecer-se entre o que vai ser morto e o que deve matá-lo. Como tão bem o mostra uma outra obra, “Jogo de Lágrimas” (“The crying game”), de Neil Jordan, em que, aos poucos, para aquele que deve matar, se torna insuportável abater alguém que viu comer, chorar, rir, ter medo, que lhe mostrou a fotografia da namorada, porque a Humanidade, em nós, é algo que custa matar, que, até onde o consigo compreender, só pode ser morta por qualquer coisa ainda mais forte: a recusa, pelo outro, dessa Humanidade em nós. (…)
»

Por Diana Andringa (jornalista). Dito numa reunião da WIIS (Women In International Security) que teve lugar no passado dia 6 em Lisboa. Publicado aqui na íntegra em A Aba da Causa.

-MG
rss 1 pá de carvão
  1. Carlos Afonso
    20/Fev/2009 | 10:03

    É por vezes é mesmo necessário falar com os nossos inimigos/algozes/…


    A usar Mozilla Firefox Mozilla Firefox 3.0.6 em Windows Windows XP
atira-lhe uma pá de carvão

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